Controvérsia fora de propósito
O burburinho que por aí vai acerca dos custos da organização em Lisboa da Jornada Mundial da Juventude soa aos meus ouvidos algum tanto exagerado e até despropositado.
Todos temos presente o modo, por dizer pouco, eufórico, como o Presidente da República anunciou a vitória da candidatura portuguesa a tal encargo. Tendo-se deslocado propositadamente ao Panamá, onde esteve presente na anterior edição do grande evento, realizado com regularidade desde a iniciativa pioneira do Papa João Paulo II, Marcelo apareceu ofegante a anunciar, antes de mais ninguém, que o Papa Francisco viria a Portugal para presidir à JMJ em 2022. Estava-se então em 2019 e ninguém seria capaz de prever a pandemia, que forçou ao adiamento da dita JMJ para o ano em curso.
Ora , sendo o Presidente da República o representante máximo do Estado Português logo se deduziu que a candidatura apresentada pelo Episcopado luso tinha sido objecto de conversações e acertos prévios com o Governo e as Autarquias Locais directamente envolvidas em tal organização. E assim tinha de facto acontecido! Acresce que os Municípios de Lisboa e de Loures se puseram de acordo para que o lugar de realização da JMJ fosse aproveitado para recuperar para uso e fruição pública uma grande extensão de terreno, na margem do rio Tejo, em pleno Mar da Palha, durante anos usado como lixeira e ainda agora preenchido por um grande parque de contentores e outras actividades de deslocalização possível.
Pretendia-se fazer novamente algo que sucedeu a seu tempo com a Expo 98, que proporcionou a ocasião para resgatar terrenos mal aproveitados e expandir a cidade para uma zona nova e de alta qualidade, mais tarde designada Parque das Nações. E é isso que torna todo o empreendimento caríssimo, exigindo quantiosas verbas aos orçamentos do Estado, das Autarquias envolvidas e até de alguma empresa pública. Se fosse para realizar todo o conjunto de eventos previstos no programa da JMJ em lugares já existentes, o custo seria obviamente muito mais baixo!
Agora que a data da JMJ se aproxima vertiginosamente, apesar do ano de atraso que sofreu, e a pretexto dos custos anunciados da estrutura a montar para o altar papal no encerramento da grande festa, tem sido um tal protestar contra os custos do dito e de outros previstos para diferentes ocasiões, como se não soubesse que tais encargos eram já previstos, ou pelo menos previsíveis, quando foram tomadas anteriormente as já referidas decisões. Mas isto é uma atitude muito portuguesa, que consiste em deixar tudo para o fim, fazendo as coisas tarde e a más horas, no meio de muita confusão e aliás também com grande capacidade de improviso…
É evidente que as pessoas estão muito sensíveis ao desperdício de recursos públicos, que se mostram tão escassos para o desempenho de funções tão essenciais para o bom funcionamento de um Estado moderno de tipo europeu, como é o nosso, nomeadamente a saúde e a educação, cujos profissionais estão até em luta por melhores salários e condições de trabalho, aliás com sobradas razões. E não falemos da pobreza, que vem alastrando com a chocante subida do custo de vida e ameaça já fortemente a própria anteriormente chamada classe média, enquanto os desequilíbrios sociais se agravam e o fosso entre ricos e pobres se vai alargando, com perigosas consequências facilmente previsíveis.
Mas ver responsáveis públicos a desdizerem-se, de um dia para o outro, reagindo à pressão dos órgãos de comunicação e das redes sociais, fugindo a assumir as responsabilidades que inegavelmente lhe cabem em todo este assunto, também não é bonito, nem contribui para o prestígio necessário das nossas instituições democráticas.
Agora que Portugal se meteu nisso, de alma e coração, a JMJ 2023 tem de ir para a frente e até ao fim! Podem ser revistos alguns projectos e reduzidos custos, talvez. Mas convém muito estar atento às movimentações de pessoas e entidades que, representando o sentir de uma parte minoritária do Povo Português, que ainda no último Censo se declarava católico em 80%, tudo aproveitam para atacar a Igreja e enxovalhar os seus dirigentes e os simples fiéis.
É certo que o Estado Português é laico e ainda bem! Mas nem vale a pena insistir nas peculiares relações desde sempre mantidas entre Portugal a Igreja Católica, para o bem e para o mal de ambas tais entidades.
Também quando da Visita Papal aos Açores, em 1991, houve vozes contra as despesas inerentes à organização dela, incluindo dos habituais defensores dos pobres, pelos vistos sempre chamados a capítulo nessas ocasiões. Mas que sentido faria andar a contar tostões - agora são já mesmo milhões… - quando se tratava de um acontecimento deveras marcante na nossa História de mais de meio milénio, nunca antes verificado e até agora não repetido, apesar das insistências feitas por quem de direito? Gastou-se o que era preciso e com todo o rigor! E todos o Povo Açoriano viveu momentos únicos, gravados nas nossas memórias e na pedra dos monumentos que ficaram a assinalar a passagem do Santo Padre João Paulo II pelas nossas belas Ilhas dos Açores.
João Bosco Mota Amaral
(Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo Ortográfico.)