Novidades sobre a Revisão Constitucional

Há de facto novidades sobre a revisão constitucional em curso na Assembleia da República e, infelizmente, não são boas para nós!

Refiro-me às recentes declarações do porta-voz do PS na Comissão Eventual competente, sentenciando que para já o voto decisivo socialista será contra quaisquer mexidas nos artigos referentes à Autonomia Insular, conforme é proposto em alguns dos projectos em apreciação, remetendo para o final dos trabalhos de consensualização em curso em cada um dos Parlamentos Regionais relativamente a tal matéria, possivelmente já em fase de uma revisão extraordinária da Constituição, que aparentemente está disponível para viabilizar.

Ora, isso tudo me parece serem afinal desculpas de mau pagador! Com efeito, não está garantido em parte nenhuma que os trabalhos da Comissão Eventual levem a uma efectiva revisão da Constituição. Se é só para fazer as mudanças cirúrgicas incluídas no texto do PS, já ficou claro que o PSD, sem cujos votos também não se logra fazer qualquer alteração, não aceitará. E um dos pontos pelos quais o PSD se bate respeita exactamente às Autonomias Insulares!

É certo que os textos apresentados pelo PSD sobre tal matéria ficam muito aquém do pretendido, o que complica as coisas. Mas a nossa longa experiência é que os dois maiores partidos políticos nacionais têm ambos uma certa tendência a favorecerem soluções de índole centralista e até a jogarem entre si a quem cabe a responsabilidade para em cada momento assumir tal papel de modo mais ostensivo…

Já o disse e repito agora: as Comissões Eventuais de Revisão Constitucional são criadas por exigência legal, mas só com um entendimento entre o PS e o PSD é que a revisão constitucional chega ao seu termo. Se há necessidade de fazer obras de melhoramento na Constituição em vigor - e há! - então os líderes dos referidos partidos têm de mandatar quem trate do assunto com a plenitude e capacidade necessárias, reservando-se para uma palavra final em algum ponto de pormenor mais controverso.

Entre as questões que merecem abordagem situam-se as que directamente dizem respeito ao regime autonómico democrático dos arquipélagos dos Açores e da Madeira. E neste domínio temos de afirmar a nossa capacidade de governo próprio já em exercício vai para quase meio século. O que implica que PS/Açores e PSD/Açores têm de falar directamente sobre a matéria e ao mais alto nível, sem esquecer que o diálogo político fundamental tem de abranger também a Madeira e os correspondentes dirigentes partidários.

A tarefa apresenta especiais dificuldades, que não se devem ignorar, pois em ambas as Regiões Autónomas está o PSD em coligação com o CDS e no caso da nossa ainda com o PPM, sem falar dos acordos de incidência parlamentar, já declarados “rasgados”, com o Chega e o IL. A realidade é que alguns desses partidos nem sequer têm representação na Assembleia da República, mas é natural que queiram fazer valer os seus pontos de vista através do seu parceiro. Acresce que vai haver eleições regionais na Madeira ainda este ano e já foi anunciado que a coligação PSD/CDS é para manter.

A tentação é grande para os maiores partidos fazerem valer a sua força e até avançarem no reforço das condições de governabilidade das Regiões Autónomas, que já há elementos suficientes para se avaliar das eventuais vantagens do alargamento do pluralismo político-partidário com representação parlamentar. Remeto para o que já aqui escrevi sobre a lei eleitoral regional e sobre a abertura a movimentos de cidadãos na apresentação de listas de candidatos a Deputados, que me parece ser uma necessidade urgente, mais benéfica e expressiva do que a pulverização de pequenos partidos.

Detenho-me um pouco a pensar nos caminhos e argumentos possíveis a utilizar e concluo que o diálogo inter-insular e inter-partidário e depois disso nacional, que se impõe não se configura como uma tarefa fácil, antes pelo contrário. Temo mesmo que estejamos perante uma situação completamente bloqueada… Quem me dera estar enganado e que de repente acontecessem avanços na nossa Autonomia. Mas parece-me mais realista ficar marcando passo por agora, na esperança de que o panorama político nacional e regional se altere em futuras eleições, conforme a vontade popular, perante quem estes temas devem voltar a ser amplamente discutidos.

João Bosco Mota Amaral

(Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo Ortográfico.)